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Pernoites. Percalços. Percutâneas picadas… Perniciosos… PERCEVEJOS!

28.09.2015 | Gerais

Arary da Cruz Tiriba

De 2012 a 2015… percevejos! Com todo o vigor, assinalados em Nova York, a ponto de hoteleiros empregarem cães farejadores para identificação de hospedarias infestadas. 

Ora! Nova-iorquinos estão por nos descobrir, a este autor, fonte individual para pesquisa — incomparável armadilha humana —, pois que já atraímos os chupa-sangues em momentos polares, ao início e ao final do curso para a profissão que elegemos — o de medicina. 

1942… Aos 16 anos, desatracamos do cais litorâneo, acenando adeus ao Gymnasio Santista, tradicional Colégio Marista, com o objetivo de nos matricular no pré-médico da capital. Primeiro contato com a São Paulo de 800 mil habitantes! Imensa… para quem procedia do bairro do Macuco, em Santos! Desembarcamos na Estação da Luz, dinheirinho contado, mil réis, dois, cinco mil réis… Não ousamos procurar hospedagem à distância do terminal ferroviário, para que não nos perdêssemos. Diante da Estação, casarões centenários com anúncio “VAGAS” (em Santos, as oceânicas; no albergue, ondas, as do colchão de capim…). Pernoite barato, não individual, com direito a baratas, mas surpresa! Às horas da madrugada, a luz é acesa, não por nós, pelo desconhecido que se aloja na camilha ao lado! Medo, só, mas não bastante. Luminosidade — súbita — expõe a profusão de insetos batendo em retirada por lençóis e paredes! Os tais percevejos!!! Maciça a infestação! Ao gosto hitchcockiano

Ora! Na manhã seguinte… caroços vermelhos, duros… grosseiros carimbos dos tatuadores sanguinários! Coceira pra lá da conta! Primeira lição prática de introdução à profissão: Parasitologia Médica ao vivo! 

1950… Virando a página, lição segunda. Sexto e último ano do Curso Médico, canudo à mão! Comemoração em Buenos Aires! Economias amealhadas, 9 de julho de 1950, quadrimotor Panair do Brasil ronca 4 horas, deposita-nos — os doutorandos da Escola Paulista de Medicina — em Ezeiza. Nove de julho, repetimos, data magna argentina [nenhuma relação com a revolução bandeirante]! Nacionalismo exacerbado — de Perón —, população do país inteiro acorrera à Capital! Supersuperlotação da hotelaria! Sem pousada, do aeroporto para a rua! Comitiva dispersa. E agora? Colegas, os remediados, de alguma forma conseguem alojamentos razoáveis. Um calhambeque da época leva-nos à pensión coletiva en la Boca. Não deu outra. Ao nascente do dia imediato… despertar cheio de caroços; intenso, o prurido, decorrente das picadas do asqueroso! 

Pior! Um catedrático da universidade austral oferece-nos recepção em sua residência. Convidara algumas niñas para a confraternização acadêmica portenho-paulistana. Ao fixar sua visão em nosso pescoço lesionado, sentenciou, alta voz, inapelável: 

Brasilēno… Sífilis! 

Dói, não dói? A essa altura, nós, por dever de ofício expert do repulsivo Cimex lectularius, submetido — segunda vez —, ao inseto da cama! Diplomaticamente, não denunciamos o endereço do pulgueiro para não ferir brios dos orgulho sos hermanos. Contida la gana, mas vontade de sobra para retrucar, à insinuação ofensiva, em portunhol. Pornografia? Apenas sutil… 

— Perdón Maestro! Brasilēno, sí! Picadura! Picadura! Pero nada de sífilis! 

Desventuras não bastantes! 16 de julho, ainda no país irmão, suportamos nosotros, brasilēnos en las calles, el “temporal” fantástico, la “lluvia” copiosa! De chistes! Final da Copa do Mundo: Brasil 1, Uruguai 2! Maracanazo! Para ficar na história… 

Tu Buenos Aires querido / cuando yo te vuelva a ver / no habrá más penas ni olvido… 

— Grande Carlos Gardel! También no habrá más “chinches”… percevejos, esse, o nome que se dá? 

Teria sido uma razão para especialização, do A., em doenças transmissíveis que incluem as produzidas pelos ectoparasitos hematófagos (pulgas, carrapatos, mosquitos, barbeiros). Qui sta il busillis..

Até aqui, palavra, a do estudante. Agora, a fala do especialista. 

Previsível a reedição, em nosso meio, do parasito, tantas as excursões turísticas à atualidade mundo afora… 

Daí, advertência, leitor! Antes das dormidas, conveniente avaliar as condições de limpeza do albergue, se cheira bem, se cheira mal. Ambiente malcheiroso deve-se, em parte, às fezes do inseto integradas ao sangue digerido; seu odor, desagradável, é penetrante, o porquê dos cães farejadores mencionados. 

Males epidêmicos, pestes, registradas desde a antiguidade, têm sido supostos extintos, fazendo-nos crer que estamos a salvo da reedição dessas ameaças. Querem ver? Sífilis, lepra, peste bubônica, tuberculose, cólera, antraz, raiva, malária, parotidite (caxumba, “papeira”), sarampo, escarlatina, tifo epidêmico, meningite cerebrospinal epidêmica, influenza, escabiose… inquietas! Surpreendentes! Qualquer que seja o continente, até no primeiro mundo! Não bastassem tais fontes epidêmicas, conhecidas dos nossos ancestrais, incorporam-se identidades mais recentes influenciadas por turismo, às vezes, por estado físico de imunodepressão: criptosporidíase; hantavirose, legionelose, febre do Nilo ocidental, diarreia de viajante… É pouco? Mas não se perturbem, em ação, já, já… sua perspicácia! 

Arary da Cruz Tiriba 

Professor universitário (EPM/UNIFESP), 

Emérito da Academia de Medicina de São Paulo