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Biografia

Alípio Corrêa Netto

Alípio Corrêa Netto nasceu em 14 de janeiro de 1898, no município de Cataguazes (MG). Graduou-se em 1923, pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), apresentando tese de doutoramento em 1924, intitulada Contribuição ao Estudo dos Cystos Congênitos do Pescoço, monografia aprovada com distinção. 

Foi aluno do professor João Alves de Lima , graduado em Paris, e fascinado pela figura desse mestre, mais tarde, a ele dedicou uma avantajada obra intitulada Um Mestre da Cirurgia – Biografia do Professor Dr. João Alves de Lima (1963), prefaciada pelo professor Pedro de Alcântara. 

Alípio Corrêa Netto possuía grande vivência como cirurgião de guerra, tendo participado da Revolução de 1932. Em 1934 publicou nos Anais da FMUSP, juntamente com Edmundo Etzel e Francisco Cerrutti, um brilhante trabalho sobre a “Cirurgia de Guerra no Hospital de Sangue de Cruzeiro”.

Fez carreira universitária, galgando a condição de professor catedrático de clínica cirúrgica da FMUSP, e atuando nesse cargo de 1935 a 1968. Destacou-se como mestre e foi formador de discípulos de nomeada, tais como: Euryclides de Jesus Zerbini , Eduardo Etzel, Arrigo Raia , Irany Novah Moraes , Rubens Monteiro de Arruda , Jorge Zaidam, Joaquim Vieira Filho, Antônio Moreira Cunha Campos, Ary do Carmo Russo, José Francisco Monteiro, Puech Leão, Walter Henrique Pinotti, Victor Spina , Orlando Ludovici, Massayuki Okumura , dentre outros de renome internacional. 

Alípio Corrêa Netto,
enquanto jovem médico.

Líder entre seus pares, Alípio Corrêa Netto contribuiu para a fundação da Associação Paulista de Medicina em 1930, e, mais tarde, para o surgimento da Associação Médica Brasileira (AMB), fundada em 26 de janeiro de 1951. Dirigiu a AMB de 1951 a 1955, inicialmente como presidente provisório, e, posteriormente, como presidente efetivo. Com pulso firme, mas conciliador, estruturou a novel entidade que ganhou prestígio, além de congregar a classe médica, fortalecendo-a. 

Alípio Corrêa Netto atuou como cirurgião e, com a patente de major, foi chefe do Serviço de Saúde da Forca Expedicionária Brasileira (FEB) durante a II Grande Guerra Mundial, trabalhando intensamente na Itália, ao lado de seu antigo aluno, o anestesista José Monteiro. Mais tarde, escreveu um livro intitulado Notas de um Expedicionário Médico (1983), relatando essa marcante experiência em sua vida . Essa obra foi prefaciada pelo seu amigo Reinaldo Ramos de Saldanha da Gama. Pela sua destacada atuação, recebeu elogios do general Mark W. Clark, comandante das Forças Americanas. 

Alípio Corrêa Netto foi colega de turma do grande clínico Jairo Ramos, e com ele lecionou propedêutica cirúrgica do abdômen, sendo autores do livro Manual de Propedêutica do Abdômen (1983). Coube a ele a primazia, em nosso meio, de subdividir sua disciplina por áreas, fautorizando um maior desenvolvimento do conhecimento.  

Alípio Corrêa Netto ingressou em 2 de janeiro de 1930 na Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Academia de Medicina São Paulo, tendo a honra de presidir esse sodalício durante um mandato anual entre 1947-1948. Pela sua competência, foi reitor da Universidade de São Paulo, de 26 de fevereiro de 1955 a 28 de março de 1957; e também professor de cirurgia de cabeça e pescoço, torácica e vascular durante 20 anos (1933-1953) da Escola Paulista de Medicina, tornando-se o primeiro chefe do Departamento de Cirurgia dessa instituição (1955-1958), do qual foi fundador, juntamente com Antônio Bernardes de Oliveira e José Maria Freitas, em 1952. Personalidade multifária, destacou-se também como político atuante, sendo fundador do Partido Socialista, deputado e secretário de estado. 

No crepúsculo de sua carreira universitária, publicou, juntamente com diversos colaboradores, o tratado em cinco volumes Clínica Cirurgia Alípio Corrêa Netto (1965), obra modelar que teve diversas edições. Escreveu também os livros: A Doença do Aleijadinho (1965), obra prefaciada por Paulo Duarte. Nela inferiu que a causa da enfermidade que mutilara o notável artista brasileiro, Antônio Francisco Lisboa, teria sido a angiite obliterante; Guia para o Residente de Cirurgia (1966, em coautoria com Irany Novah Moraes); Um Ponto no Infinito (1969) e Metodização da Pesquisa Científica (1970, em coautoria com Irany Novah Moraes), obra prefaciada pelo professor Lucas Nogueira Garcez. 

Segundo seu biografo Carlos da Silva Lacaz, Alípio Corrêa Netto “no exercício da profissão, comportou-se sempre como um esteta, sabendo compreender e sentir toda a grandeza da medicina, com irreprimível vocação. Do alto de sua onipotência moral e científica, o trabalho do renomado mestre sempre cresceu sob o impulso de uma paixão silenciosa que nunca o abandonou, dispensando sagacidades e ardilezas para se afirmar e vencer. Quando considerado na sua integral figura humana, o renomado professor mais se agiganta. De cada meta atingida, Alípio Corrêa Netto fez sempre um ponto novo de partida.” 

Alípio Corrêa Netto faleceu na cidade São Paulo, em 24 de maio de 1988, nonagenário. Seu corpo foi velado na FMUSP e, posteriormente, transladado para o Crematório da Vila Alpina, conforme seu desejo. A oração fúnebre em sua homenagem foi feita no dia seguinte, no teatro da FMUSP, pelo seu discípulo e amigo, professor Irany Novah Moraes. 

Por ocasião de seu centenário de nascimento, assim se expressou Carlos da Silva Lacaz: “há um pensamento que se aplica de maneira certa ao eminente professor, ao educador de raros méritos, cirurgião renomado, destacado homem público, ao cultor das boas letras e, acima de tudo, ao médico que soube sentir desde cedo a transcendência da arte divina localizando-a dentro das grandes categorias do pensamento humano: ‘olhando bem, o tempo não se conta pelo tempo que passou, mas pelo que se fez do tempo. Não se conta pelo que o tempo nos dá, mas pelo que nós damos ao tempo. A gente só possui da vida o que deu de si’. Nos elogios que fiz à personalidade do professor Alípio Corrêa Netto não existe menor exorbitância afetiva. O querido mestre merece muito mais. Nas lições de sua vigorosa personalidade, pode-se ver um exegi monumentum laboriosamente edificado e que haverá de perdurar.” 

Alípio Corrêa Netto é honrado como patrono da cadeira nº 12 da augusta Academia de Medicina de São Paulo; dá nome a um hospital municipal no bairro de Ermelino Matarazzo, a uma escola municipal e a um Centro de Estudos do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, na capital paulista; a uma rua no bairro Vila Tênis Clube, na cidade de Assis; e a uma rua no bairro Vila Júpiter na cidade de São Bernardo do Campo. 

NOTAS: 

Esta biografia é uma autoria do Acad. Helio Begliomini, Titular e Emérito da cadeira nº 21 da Academia de Medicina de São Paulo sob o patrono de Benedicto Augusto de Freitas Montenegro.

João Alves de Lima foi presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Academia de Medicina de São Paulo, por dois mandatos anuais entre 1907-1908 e 1913-1914.

Euryclides de Jesus Zerbini é o patrono da cadeira nº 29 da Academia de Medicina de São Paulo. 

Arrigo Antonio Raia é membro honorário da Academia de Medicina de São Paulo. 

Irany Novah Moraes presidiu a Academia de Medicina de São Paulo durante um mandato bienal entre 1983-1984, tornando-se membro honorário desse silogeu. 

Rubens Monteiro de Arruda é o patrono da cadeira nº 123 da Academia de Medicina de São Paulo. 

Victor Spina é o patrono da cadeira nº 14 da Academia de Medicina de São Paulo. 

Massayuki Okumura é membro honorário da Academia de Medicina de São Paulo.

Jairo de Almeida Ramos foi presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, hoje, Academia de Medicina de São Paulo, por um mandato anual entre 1939-1940, e é o patrono da cadeira no 75 desse sodalício. 

Antônio Bernardes de Oliveira é o patrono da cadeira no 109 da Academia de Medicina de São Paulo.  

Sabe-se hoje que a causa mais provável das lesões apresentadas por aleijadinho, teria sido a hanseníase em sua forma virchowiana ou, então, a porfiria, segundo o professor Paulo da Silva Lacaz. 

Esse livro foi escrito por ocasião da realização do primeiro transplante cardíaco, no Brasil, por Euryclides de Jesus Zerbini. Trata-se de um belo romance onde o autor retrata as alterações de personalidade e as mortificações da filosofia de vida do indivíduo submetido a um transplante cardíaco. Assim, Januário Lopes da Silva recebia na “cidade grande” um “coração emprestado”. Sua alma ficou cheia de dúvidas e incertezas. Esse livro foi prefaciado pelo próprio Euryclides de Jesus Zerbini, sendo a capa de Benedito J. Duarte, o grande artista brasileiro que se notabilizou na elaboração de filmes científicos, inclusive o do transplante cardíaco. Segundo Carlos da Silva Lacaz, as cinzas de Benedito J. Duarte, por expresso desejo seu, estão colocadas em pequena urna nos jardins da FMUSP. 

Lucas Nogueira Garcez foi engenheiro, professor, político e governador do estado de São Paulo entre 1951 e 1955. 

Carlos da Silva Lacaz foi presidente da Academia de Medicina de São Paulo por um mandato anual entre 1962-1963, e é o patrono da cadeira nº 75 desse sodalício. 

Guardo com ternura e gratidão ter tido o ilustre professor Alípio Corrêa Netto como um dos que ratificaram minha entrada na querida Academia de Medicina de São Paulo, fato consumado em 8 de agosto de 1986.

Exigi monumentum é uma expressão latina que pode ser traduzida por “construiu um monumento” ou “construtor de monumento”