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Café com presidente(s), por Acad. Arary da Cruz Tiriba

08.08.2013 | Tertúlias

Coffee break do VI Simpósio Brasileiro de Síndrome Pós-Poliomielite, maio de 2013, Teatro Marcos
Lindenberg, UNIFESP.

Uma das poucas fotos de Roosevelt na cadeira de rodas


Um palestrante acabara de discorrer sobre Franklin Delano Roosevelt (FDR), alvo mais famoso da poliomielite nos tempos modernos. De costas para o casal de participantes, repeti o cafezinho para acompanhar, sem chamar a atenção, o comentário sobre FDR e Getúlio Dorneles Vargas (GV); o conhecimento do locutor excedia o do expositor anunciado para o assunto.
— “Siglas só se aplicam a presidentes exponenciais” — era o que falava.
E continuou:
— Em agosto de 1921, FDR, aos seus 39 anos, elegera para as férias a ilha de Campobello, no Canadá.
[Campobello é nome de provável origem lusitana]. Correra quilômetros e megulhara nas águas geladas da baía de Fundy. Canseira e coluna vertebral dolorida (à noite), atribuiu-as ao lumbago. Pernas enfraqueceram e paralisaram. Para o médico de família local, um “resfriado comum”. Renomado clínico, Dr. Keen, de passagem pelo local, igualmente em férias, postulou: coágulo de sangue na medula lombar! Recomendação de massagens terapêuticas para ativar a circulação… Só após duas semanas de sondagens da bexiga e de enemas (praticados por D. Eleanor e pelo amigo mais chegado), Robert Lovett, especialista de Boston, afirmou de imediato: Doença de Heine Medin. Fatura: 600 dólares; assustadora para a época!
Em prosseguimento… O historiador? O articulista político? Quem seria?
— Roosevelt e Vargas, ambos formados em Direito, trocaram figurinhas. Às suas mãos, instrumentos
diferentes; singularmente, propósitos comuns. Invertidos os padrões das fantasias nacionais! O americano
do Norte desprezando o figurino xerife, trajes civis, galgara o poder pela dialética. O americano do Sul –
anos 30, uniforme de campanha –, fixou-se (adesividade), segundo esquema misto de provisório com
permanente, por eleição… voto pessoal, único, irrecorrível! FDR conseguiu “participação” de Sul e Norte.
GV, quase o mesmo, “partição”, rachadura no tronco frondoso. Um e outro enfrentaram crise econômica
mundial; criaram dispositivos sociais, algo semelhantes; lá em cima, a proposta “new deal”; cá em baixo, a
política trabalhista…
E acrescentou:
— A despeito das dificuldades de locomoção (FDR evitava a exposição pública na cadeira de rodas), da
extensão de sua paralisia, mantida fora do alcance dos olhares (somente após sua morte, tornar-se-ia a
principal parte de sua imagem), determinadamente se deslocou até o Brasil para (abre aspas) convencer
(fecha aspas) GV à mudança de rumos. “Sorrisos” de parte a parte, GV fez as concessões “espontâneas”
ao colega estadista incapaz de dar um passo à frente pelos próprios meios; cedeu bases (Fernando de Noronha, Parnamirim…), trampolins das tropas americanas para o Norte da África.
O narrador rememorou:
— Episódios… da guinada do Brasil para a entrada na 2ª Guerra Mundial. Incapaz para a marcha, pessoal? FDR? Ordinário, marche! Ordenara… o militar!
Empolgado, prosseguia:
— Notaram o vigor de FDR? A pólio não derrotara aquele paraplégico, por 4 vezes sucessivas presidente dos “states”! Morreu na 4ª legislatura, antes do término da 2ª Guerra Mundial. E deixou a questão
em aberto! Segundo intrigas (literárias e de Estado), teria tido conhecimento prévio do ataque do Japão a
Pearl Harbor, mas… na moita… para inflamar a população do país a entrar na guerra. GV, a seu modo,
distendeu o mandato, 15 anos! Tiro no peito, seu fim. Suicídio! Pelo menos, o que a história “enrola”,
perdão, quis dizer o que a história “arrola”.
Loquaz, pretendia continuar… Pena! Ouvido com atenção, papo interrompido para retomada do conclave.
Neurologistas, psicólogos, psiquiatras, fisioterapeutas, sanitaristas, de São Paulo, Curitiba e Brasília, retomaram seus assentos. Adultos (quantos!), sobreviventes da “infantil”, empenhados no encontro de soluções para minorar-lhes o sofrimento físico e para derrubar o muro social e profissional erguido para
segregá-los, rodaram cadeiras, preencheram o auditório!
Vez da dama (a Dra. Eliana Correia de Aquino, bacharel em Direito, Presidente de Honra), também vítima, expoente em ministério planaltino, discorrer sobre as medidas para enfrentamento da situação. Depoimento candente.
A O.M.S. previra a extinção da varíola, efetivamente alcançada em 1997. [A menos que algum insano
reinvente-a via bioterrorismo]. A Instituição chegou a prever a erradicação da pólio para o ano 2000.
Aconteceu? Igual à varíola? Não.

A comunidade ainda não se livrou do mal avoengo, razão do VI Simpósio com o foco Desafios e
Esperanças.
Graças às informações de imagem médica, anatomia patológica e biologia molecular, sabe-se que egípcios, 2.000 anos antes de Cristo, identificavam a poliomielite; hoje, com vacinas disponíveis, ultrapassada?
Assombração do passado?
Pólio, paralítica, consecutiva à vacina oral, constitui rea­ção adversa. A reversão é desejável em quase
todos os receptores, porém sem efeito deletério. Infelizmente, em raros casos, a doença paralítica se renova, indistinguível da do vírus selvagem. O mecanismo é suposto à mutação, à reversibilidade ao neurotropismo predominante. Por extensão, indivíduos suscetíveis, em contato estreito com os receptores de vacina oral, estão sujeitos a adquirir, igualmente, paralisia.
Observada em pessoas de 18 anos ou mais, a paralisia resultante pode tornar-se permanente. Mais suscetíveis, crianças portadoras de imunodeficiências, a exemplo daquelas que apresentem agama ou hipogamaglobulinemia.
Nobre o trabalho da equipe da UNIFESP, coordenada pelo Professor Doutor Acary Souza Bulle Oliveira, para orientação, assistência e reabilitação das vítimas da pólio. Embrião para o Centro de Reabilitação, modelo Warm Spring, Geórgia, EUA, criado por Roosevelt em 1927.
Afinal, no coffee break, quem seria o desconhecido dos comentários paralelos, sobre um e outro presidente? Ora, algum sabe-tudo…, desses que não faltam às ocasiões! Não presidiu sessão, mas… café com presidente(s).