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Formas e Inteligência, QI, por Acad. Jenner Cruz

19.03.2013 | Tertúlias

Pouco depois de minha formatura, entrei, por concurso público, no Setor Médico do Departamento de Águas e Esgotos (DAE) e, pouco tempo depois, por novo concurso público, tornei-me Chefe da Seção de Serviço Social desse Departamento. Essa Seção compreendia 4 setores: Administrativo, Médico, Odontológico e Social. Eu trabalhava apenas no período da tarde e nossa Seção era subordinada à Divisão do Pessoal, cujo Diretor era advogado.
Aprendi muito com ele, Dr. Cláudio José Santoro, que me inscreveu em vários cursos, de Administração do Pessoal, Problemas Brasileiros, Dinâmica Administrativa, Inglês, Ensino Correto de um Trabalho, Relações Humanas no Trabalho, Técnicas de Chefia, Legislação, Higiene e Segurança Industrial. Porém, o mais importante foi me ensinar a nunca assinar nenhum documento sem ler, além de aulas práticas inesquecíveis sobre como tratar o homem humilde, que muito me ajudaram na formação de meu cará­ter.
Num desses cursos, um colega de outra empresa resolveu medir o Quociente Intelectual dos participantes, conforme ele aprendera. Tirei uma das notas mais baixas: 74. Fiquei abalado.
Mais tarde, o DAE passou a ser denominado Superintendência de Águas e Esgotos da Capital: nossa Seção ganhou um prédio novo, aparelho de Raios X, eletrocardiograma, sala de ginecologia, sala de fisioterapia, etc.
Quando fui admitido, nossa Seção dava alguns remédios para vermes, para dores e poucos outros. Ampliamos muito o número e a qualidade desses remédios; tínhamos um grande almoxarifado e um encarregado de armazenamento, controle e distribuição das drogas.
Porém, a SABESP foi criada, e meu chefe passou para o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE). Ganhei uma chefe nova, com atitudes que muito me desagradaram. Fui convidado a trabalhar em tempo integral na SABESP, convite que declinei porque não queria me dedicar apenas a serviços burocráticos; então, saí da SABESP.
Fizemos alguns trabalhos de pesquisa com os trabalhadores. Demonstramos que aqueles que trabalhavam com água suja (esgoto) tinham muito mais reações positivas para leptospirose do que aqueles que trabalhavam com água limpa (água tratada). Quase todos que tinham reações positivas para leptospirose nunca haviam ficado doentes. Provamos que 1.200.000 U de Benzetacil® (penicilina), aplicadas duas vezes por mês, impediam quase sempre o aparecimento de novos casos.
Quando criança, eu aprendera que existiam três formas de inteligência. Como tinha muita facilidade com contas, tirava geralmente nota dez em Matemática. No curso colegial, durante uma aula de Física, o professor havia esquecido como prosseguir num problema. Pedi licença, levantei-me e completei o que o professor não conseguia fazer, sem que nunca tivesse tido conhecimento da matéria. Numa prova de Matemática, somente eu tirei nota dez, resolvendo um problema, que ninguém conseguira, por três modos diferentes. Na admissão para a Faculdade de Medicina, entrei na primeira vez por ter tirado média 9,5 em Física, por ter resolvido os problemas, apesar de ter tido notas baixas em Química e Biologia, sendo que em cada uma caíra uma questão que não estudara no colégio.
Porém, eu sabia que era nulo em Música. No ginásio, como era comportado e aprendia a matéria ministrada, tirava sempre boas notas na disciplina. Mas meu professor tinha montado um coro, para brilhar nas solenidades. Nos ensaios, vendo minha total incapacidade musical, dizia:
— Jenner, por favor, você abre e fecha a boca como se cantasse, mas não emita nenhum som, senão vai estragar meu
coro.
Gosto de música simples, facilmente decorável, mas não consigo assistir a apresentações de música clássica, óperas,
nem música moderna.
Também, embora tentasse, logo descobri que nunca seria um atleta.
A ideia de medir a inteligência é muito antiga, talvez date do século V, na China, mas ganhou força no fim do século
XIX e início do século XX.
Em 1905, Alfred Binet e Theodore Simon criaram a Escala de Binet-Simon, utilizada para identificar estudantes que pudessem necessitar de ajuda escolar. Eles, entretanto, informavam que tal escala não permitia a medição da inteligência. Um aluno com nota baixa na escala precisava de maior cuidado de seus professores, mas isso não queria dizer que ele tivesse incapacidade de aprendizado.
O termo QI (Quociente de Inteligência) foi criado em 1912, por Wilhelm Stern, que introduziu também os termos “idade mental” e “idade cronológica”. O QI seria igual à divisão da idade mental pela idade cronológica. Em 1916, Lewis Madison Terman resolveu multiplicar o QI por cem, para eliminar números decimais. Para medir a idade mental, criou um teste, que uma criança poderia terminar em apenas 50 minutos. Ele acreditava que o QI era uma habilidade mental inata, mensurável tanto quanto a altura e o peso. Esse “dote original” seria imutável, não sendo alterado pela educação, pelo ambiente familiar, nem por outras ocorrências durante a vida.
Sua classificação era a seguinte:
QI acima de 140 = genialidade;
entre 121 e 140 = inteligência muito acima da média;
entre 110 e 120 = inteligência acima da média;
entre 90 e 109 = inteligência normal;
entre 80 e 89 = embotamento;
entre 70 e 79 = limítrofe;
entre 50 e 69 = raciocínio lento.
Em 1917, ele conseguiu que mais de 1,7 milhão de americanos convocados para a Primeira Grande Guerra fizessem o teste e pretendia que pessoas com pontuações muito baixas, menores que 75, fossem internadas, além de desencorajadas ou proibidas de terem filhos.
Embora ele tivesse opositores, como o jornalista Walter Lippmann, que mostrou que crianças prodígio não costumam ter um desempenho extraordinário na vida adulta, até hoje se mede o QI em muitos lugares e de muitas maneiras.
Passemos para as formas de inteligência.
Hoje, sabemos que as inteligências são múltiplas, divididas em pelo menos oito formas:
Linguística ou verbal: característica de atores, apresentadores, locutores, professores, advogados, etc.
Inteligência lógica-matemática: matemáticos, cientistas, engenheiros, economistas, físicos, etc.
Musical: compositores, artistas, cantores, músicos, etc.
Corporal-cinestésica: atletas, cirurgiões, dançarinos, artesãos, etc.
Espacial ou visual: médicos, navegadores, pintores, arquitetos, etc.
Naturalista ecológica: ambientalistas, arqueólogos, ecologistas, etc.
Interpessoal: pais, religiosos, psicólogos, vendedores, professores, etc.
Intrapessoal: líderes, gurus, conselheiros, mentores, filósofos, etc.
Não sei se tenho outra inteligência significativa além da relacionada à Matemática. Sei que não tenho inteligência musical, nem aquela relativa aos esportes. Aprendi a atender os meus pacientes com muita paciência e dedicação. Gosto de livros e filmes de suspense ou de mistério. Também adoro casos clínicos complicados e ter que empregar minhas habilidades aritméticas para elucidá-los.
Quero deixar bem claro que os seres vivos, e os homens em particular, têm uma ou mais formas de inteligência, com poucas exceções. Quando um homem não tem desenvolvi­mento da glândula tireoide na vida intrauterina, não desenvolve nenhuma forma de inteligência. Em medicina, é denominado cretino. Infelizmente, essa lesão cerebral é irreversível. Se, por diferentes motivos, ele desenvolve hipo­ti­reoidismo na fase adulta, também vai desenvolvendo, len­tamente, embotamento cerebral, que, porém, é reversível com o uso, por via oral, do hormônio da tireoide: levotiroxina.
Se o hormônio da tireoide é muito importante no desenvolvimento do cérebro, o fósforo não é. Existe uma síndrome rara, na qual os túbulos renais perdem a capacidade de reter fósforo, provocando níveis baixíssimos de fósforo no sangue, no organismo e nos ossos, provocando fraturas patológicas seguidas, mas sem afetar em nada a inteligência.
Algumas pessoas podem parecer tolas em muitos atos, como o Garrincha, que tive a oportunidade de ver jogando futebol, em 1962, fazendo três gols, mas que deveria ter altíssima inteligência corporal-cinestésica, para ser o grande campeão que foi.
Segundo a literatura, os maiores gênios da humanidade morreram com dificuldades financeiras ou pobres, bem como algumas crianças, de baixa genialidade na infância, como Albert Einstein, Isaac Stern e Yehudi Menuhin, tornaram-se grandes na idade adulta.
Finalizando, acredito que o QI não é estável. O estudo, as doenças e as diferentes oportunidades da vida podem aumentá-lo, como podem diminuí-lo. É fruto de uma ou de várias formas de inteligência, somadas às oportunidades e também ao temperamento. Uma pessoa pode ser muito egoísta, ou muito altruísta, muito ou pouco ciumenta, orgulhosa, tímida, etc. São traços, alguns inatos, que podem ser alterados pela educação e por ocorrências que aparecem durante a vida.