PortugueseEnglishSpanish
Notícias

Perspectivas sobre “transplante de pulmão” são expostas em Tertúlia Acadêmica

09.11.2023 | Acadêmicos, Tertúlias

A edição de novembro da Tertúlia Acadêmica, realizada pela Academia de Medicina de São Paulo, aconteceu na última quarta-feira (08), recebendo o acadêmico Paulo Manuel Pêgo Fernandes – que também é diretor Científico da Associação Paulista de Medicina, professor Titular e vice-diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – como palestrante.

Com foco no tema “Transplante de pulmão – situação atual e perspectivas futuras”, a apresentação relembrou a trajetória dos transplantes pulmonares e o papel de protagonismo do Instituto do Coração (InCor), que em dezembro do ano passado realizou o 500º procedimento com a equipe comandada por Pêgo.

O presidente da AMSP, Helio Begliomini, salientou a satisfação em receber o especialista para falar sobre um tema tão complexo. “Nosso palestrante é um menino prodígio que estudou na mais antiga instituição médica do nosso estado, a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Na formatura, recebeu o prêmio Edmundo Vasconcelos, dado a quem mais se destacava na área cirúrgica. Ele também alcançou o primeiro lugar na prova de residência para Cirurgia e Cirurgia Cardíaca, especialidade que escolheu. Fez toda a sua carreira na FMUSP, em que atualmente é vice-diretor e tem uma vida acadêmica intensa.”

Assumindo a palavra, Paulo Pêgo recordou alguns profissionais que elucidaram o caminho para a realização de transplantes, salientando que até o final da década de 1980, todos obtiveram resultados malsucedidos, com exceção do transplante renal. “A grande mudança foi o avanço da ciclosporina, já que, graças a ela, mudou-se a história do transplante de órgãos sólidos no mundo, inclusive o de pulmão. No Brasil, o ano que mais se fez transplante foi 2018, havendo uma diminuição posterior por conta da pandemia de Covid-19. A maioria deles são feitos em São Paulo, seguido pelo Rio Grande do Sul, enquanto os outros estados fazem bem poucos.”

Indicações e técnicas

Dentre as principais condições que levam profissionais a recomendarem a realização do transplante estão o enfisema e a fibrose pulmonar. Hipertensão pulmonar, fibrose cística, miscelânea e bronquiectasia também correspondem ao grupo. As indicações para a cirurgia correspondem aos pacientes que passaram por um tratamento inefetivo ou que não está disponível; aqueles que têm uma expectativa de vida limitada, entre dois e três anos; possibilidade de reabilitação em nível ambulatorial; que possuam perfil psicossocial adequado e possam contar com suporte familiar; além de possuírem um estado nutricional adequado.

As contraindicações absolutas são para pacientes com doença coronariana importante; que tiveram alguma neoplasia maligna nos últimos dois anos; infectados por HIV; com Hepatite B ou C ativa; que não tenham suporte social ou que possuam algum vício (como álcool, tabaco ou drogas); lidando com obesidade ou desnutrição extrema e que possuam deformidades no tórax ou na coluna. Por sua vez, as recomendações relativas vão de acordo com a idade; casos de osteoporose sintomática; uso de corticosteroides; distúrbios psicossociais, entre outros.

O especialista descreveu como é feita a cirurgia e relembrou que os tipos e técnicas operatórias se dividem em quatro: unilateral, bilateral, cardiopulmonar e lobar intervivos, este último sendo realizado com frequência no Japão. “A preservação dos órgãos no transplante e a questão da imunossupressão são duas grandes chaves. Atualmente, há soluções que permitem que um órgão possa ser mantido guardado em um período de 12 a 14 horas.”

Além disso, Pêgo também destacou o período de sobrevida de pacientes transplantados. “Em um ano, é em torno de 85% a 90%. Quando pegamos a curva internacional, os dados são razoavelmente semelhantes, mas uma coisa que chama a atenção é que a partir de dois anos e meio, a sobrevida dos transplantes bilaterais são maiores que os unilaterais. Por isso, a tendência é ter mais bilaterais, principalmente nos mais jovens.”

Desafios

A necessidade de conscientização está entre um dos principais desafios a serem enfrentados, uma vez que há um número muito baixo de doadores por conta de diferentes questões, dentre elas a recusa familiar. Na lista de doadores efetivos, os Estados Unidos lideram o ranking, seguido pela Espanha, enquanto o Brasil ocupa a 24ª posição.

Além disso, o aproveitamento de órgãos, que possui um baixo índice, também é um grande problema – atualmente apenas 5% a 6% dos pulmões são utilizados, 15% dos corações, 45% dos fígados e 80% dos rins. Isso acontece pois cada órgão possui particularidades muito distintas e, no caso do pulmão, que acaba tendo uma grande relação com o exterior, é mais fácil de haver infecções. Ter uma equipe multidisciplinar bem preparada e a questão das filas de espera também correspondem a dificuldades a serem enfrentadas neste cenário.

Para Paulo Pêgo, é preciso observar para onde se está indo, para, assim, continuar evoluindo. “Na Europa, uma das coisas que tem andado bastante é a preservação de órgãos, já existem várias máquinas de transporte que possibilitam isso. No Brasil, por uma questão de custos, isso ainda não é tão forte, mas caberia muito bem por suas dimensões continentais. Nós nunca usamos um pulmão do Norte para levá-lo ao Sul, por exemplo, pela questão de isquemia. Essa situação tem mudado, mas no Brasil ainda precisa melhorar.”

O médico relembrou o caso de um paciente de 31 anos, internado com Covid-19 em março de 2021, com descompensação grave, necessitando ventilação por intubação e com a radiografia mostrando traumas. Mesmo tratado clinicamente, houve uma piora em seu quadro, precisando ser exposto a uma demonstração de ECMO por 128 dias – um dos recordes mundiais – enquanto aguardava o transplante. Em agosto do mesmo ano, o pulmão do paciente já estava destruído, mas com o transplante bilateral, pôde se recuperar, evoluindo bem no pós-operatório, recebendo alta 30 dias após a cirurgia e seguindo em acompanhamento até a atualidade.

“Nós temos trabalhado tanto em nível individual quanto de equipe, buscando fontes de custeio. Quem está nessa linha de frente sabe muito bem que é uma luta diária, essa discussão de custos, para que possamos conseguir, assim, manter a viabilidade dos transplantes”, complementou o cirurgião.

Texto: Julia Rohrer – Comunicação – Associação Paulista de Medicina

Fotos: Alexandre Diniz